Velocino Pacheco Filho
Dispõe o art. 150, § 6º, da Constituição: “Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155,§ 2º, XII, g”.
O dispositivo citado diz que “cabe à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados”. A Lei Complementar 24, de 1975, trata da concessão e revogação de isenções e outros benefícios fiscais do ICMS, mediante convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal.
Conforme art. 4º dessa lei, os convênios serão ratificados mediante decreto publicado pelo Poder Executivo de cada Unidade da Federação. Considera-se tacitamente ratificado o convênio se não houver manifestação do Estado no prazo previsto no referido artigo. Determina o art. 7º que os convênios ratificados obrigam todas as Unidades da Federação, inclusive as que não se tenham feito representar na reunião.
A expressão “sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g”, contida no § 6º do art. 150 da Constituição, ressalva o que? (i) que as exonerações do ICMS podem ser concedidas apenas por convênio, sem necessidade de lei? (ii) ou que o convênio é uma condição necessária para que o Estado conceda, por lei, a isenção ou benefícios fiscal?
A concepção da Lei Complementar 24, de 1975, portanto, exclui o Poder Legislativo das deliberações sobre as concessões e revogações de benefícios fiscais relativos ao ICMS. Tudo é decidido pelo Confaz, colegiado que reúne os secretários de fazenda ou de finanças dos Estados e do Distrito Federal.
Contudo, as leis que integram ordenamentos jurídicos anteriores à Constituição somente são recepcionadas pelo ordenamento vigente na medida em que forem compatíveis com a Constituição vigente.
Ora, as isenções e demais exonerações tributárias são matérias sujeitas à reserva absoluta de lei. Quer dizer: não podem ser delegadas ao Poder Executivo. Logo, não podem ser concedidas por convênios negociados e celebrados por servidores do Poder Executivo.
Assim, não poderia ser outra a posição do Pretório Excelso, no julgamento da ADI 1.247/MC PA, Rel. Min. Celso de Mello, em 17-8-95 (DJ 8-9-95, pp 28354; Ementa vol 1799-01, pp 20):
“A celebração dos convênios interestaduais constitui pressuposto essencial à válida concessão, pelos Estados-membros ou Distrito Federal, de isenções, incentivos ou benefícios fiscais em tema de ICMS. Esses convênios - enquanto instrumentos de exteriorização formal do prévio consenso institucional entre as unidades federadas investidas de competência tributária em matéria de ICMS - destinam-se a compor os conflitos de interesses que necessariamente resultariam, uma vez ausente essa deliberação intergovernamental, da concessão, pelos Estados-membros ou Distrito Federal, de isenções, incentivos e benefícios fiscais pertinentes ao imposto em questão. O pacto federativo, sustentando-se na harmonia que deve presidir as relações institucionais entre as comunidades politicas que compõem o Estado Federal, legitima as restrições de ordem constitucional que afetam o exercício, pelos Estados-membros e Distrito Federal, de sua competência normativa em tema de exoneração tributaria pertinente ao ICMS. MATÉRIA TRIBUTARIA E DELEGAÇÃO LEGISLATIVA: A outorga de qualquer subsidio, isenção ou crédito presumido, a redução da base de calculo e a concessão de anistia ou remissão em matéria tributária só podem ser deferidas mediante lei especifica, sendo vedado ao Poder Legislativo conferir ao Chefe do Executivo a prerrogativa extraordinária de dispor, normativamente, sobre tais categorias temáticas, sob pena de ofensa ao postulado nuclear da separação de poderes e de transgressão ao princípio da reserva constitucional de competência legislativa. Precedente: ADIn 1.296-PE, Rel. Min. CELSO DE MELLO”.
Mais recentemente, a Primeira Turma desse Tribunal Superior, no julgamento do AgR no RE 630.705 MT; Rel. Min. Dias Toffoli, em 11-12-2012, decidiu:
“2. Os convênios são autorizações para que o Estado possa implementar um benefício fiscal. Efetivar o beneplácito no ordenamento interno é mera faculdade, e não obrigação. A participação do Poder Legislativo legitima e confirma a intenção do Estado, além de manter hígido o postulado da separação de poderes concebido pelo constituinte originário”.
Portanto, a concessão e a revogação de isenções e outras exonerações tributárias, em tema de ICMS, devem atender, simultaneamente, duas condições: (i) ser autorizada por convênio e (ii) ser editada a competente lei em sentido formal.
O Poder Legislativo não pode ser afastado do processo, como vem sendo feito até agora. Os Estados devem rever o seu procedimento, sob pena das isenções e benefícios fiscais em vigor perderem sua eficácia, porque se tornaram inconstitucionais.
Para eliminar riscos de ilegalidade, os Estados têm solicitado referendo das Assembleias Legislativas aos convênios assinados. Entretanto, de plano, há a delegação desta mesma Assembléia para que o Poder Executivo estadual promova políticas econômico tributárias de incentivos, com renúncia de receitas e/ou devolução de impostos (Ref. Navarro Coelho, "Competência Exonerativa").
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