Decadência
e prescrição no IPVA
Velocino
Pacheco Filho
O
art. 189 do novo Código Civil conceitua a prescrição em razão da pretensão –
prazo em que esta se extingue pela inércia do titular do direito em exercê-la.
A decadência, pelo contrário, refere-se aos chamados direitos potestativos ou
direitos cujo exercício é incontroverso, não cabendo qualquer discussão (à
outra parte cabe apenas sujeitar-se ao seu exercício). À evidência, a
constituição de ofício do crédito tributário, pela Fazenda Pública, não é um
direito potestativo.
Assim,
a decadência no direito tributário, muito singelamente, refere-se á extinção do
direito da Fazenda Pública de constituir o crédito tributário, mediante
procedimento administrativo de lançamento. Já a prescrição, cujo prazo começa a
correr a partir da constituição definitiva do crédito tributário (CTN, art.
174), refere-se ao direito de ajuizar a competente ação de execução fiscal
(pretensão impositiva da Fazenda Pública).
O
art. 142 do CTN conceitua lançamento como o procedimento administrativo,
privativo da autoridade, de constituir o crédito tributário, compreendendo,
entre outros elementos, a verificação da ocorrência do fato gerador da
correspondente obrigação.
Ora,
a incidência do tributo depende da conjugação da norma com o fato, ou seja, da
sua previsão em lei com a ocorrência de fato-do-mundo que corresponda ao fato
descrito na lei como hipótese de incidência tributária.
A
norma que podemos extrair dos textos normativos (ou a partir deles construir) diz-se
geral (dirigida a todos) e abstrata (descreve fato ainda não acontecido). O
lançamento, por sua vez, corresponde à construção, pela autoridade administrativa
competente, de norma individual (dirigida a contribuinte determinado) e
concreta (refere-se a fato já acontecido).
Continuando
a rever conceitos, temos que a notificação é a comunicação ao sujeito passivo
do lançamento, intimando-o a recolher o tributo. O lançamento aperfeiçoa-se com
a notificação, de modo que o lançamento que não foi regulamente notificado ao
sujeito passivo não produz efeitos (não pode ser cobrado).
Pois
bem, o art. 4º da Lei 7.543/88, que instituiu o IPVA em Santa Catarina,
determina que “o imposto será devido anualmente e recolhido nos prazos fixados
em regulamento”. O cálculo, pelo sujeito passivo, do imposto devido, mediante
consulta à tabela aprovada por portaria do Secretário da Fazenda (RIPVA, art.
3º, § 2º), e seu subseqüente recolhimento na rede bancária, integralmente ou
parcelado, nos prazos determinados pelo art. 10 do RIPVA, nada mais é que
simples cumprimento de dever legal. Isto por que as disposições de lei, do
regulamento e das portarias do Secretário da Fazenda (tabelas) referem-se à
norma geral e abstrata – dirigem-se a todos e referem-se a evento hipotético
(fato ainda não acontecido).
Ora,
a Segunda Turma do STJ decidiu no AgRg no Agravo no Resp 185.322 SP, relator o
Min. Humberto Martins, que “a constituição do crédito decorrente de imposto
sujeito a lançamento de ofício ocorre no momento da notificação para pagamento,
e não da data da lavratura do auto de infração que aplica a multa por falta de
pagamento”.
Com
efeito, enquanto não houver manifestação da Fazenda Pública cobrando o IPVA,
corre apenas prazo de decadência. É preciso que a Fazenda lance o imposto –
edite norma individual e concreta – para que seja constituído o crédito
tributário e passe a correr o prazo de prescrição.
No
caso da legislação catarinense não há qualquer ato por parte da Fazenda Pública
cobrando o IPVA, cabendo ao sujeito passivo calcular o imposto devido, pela
consulta das tabelas respectivas, e efetuar o recolhimento junto à rede
bancária, integralmente ou parceladamente, nos prazos regulamentares, à sua
escolha. Somente após o decurso do prazo regulamentar, sem que o sujeito
passivo tenha efetuado o recolhimento, é que a Fazenda promove a constituição
de ofício do crédito tributário e a imposição da multa pertinente.
Neste
ponto, devemos indagar se o IPVA em Santa Catarina é efetivamente tributo sujeito
a lançamento direto ou, pelo contrário, se sujeita a lançamento por
homologação? Ora, se a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de
calcular e recolher o tributo, “sem prévio exame da autoridade administrativa”,
estamos, nos termos do art. 150 do CTN, diante de lançamento por homologação. Assim
sendo, o prazo de decadência corre a partir da ocorrência do fato gerador que, no
caso do IPVA, o art. 2º, III, da Lei 7.543/88, fixa em 1º de janeiro de cada
ano.
Portanto,
enquanto não houver manifestação inequívoca da Fazenda Pública, cobrando o
IPVA, corre prazo de decadência e não de prescrição, de acordo com a
jurisprudência colacionada do Superior Tribunal de Justiça.
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