DIREITO TRIBUTÁRIO EM DEBATE

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sexta-feira, 14 de junho de 2013

Decadência e prescrição no IPVA  
          Velocino Pacheco Filho

O art. 189 do novo Código Civil conceitua a prescrição em razão da pretensão – prazo em que esta se extingue pela inércia do titular do direito em exercê-la. A decadência, pelo contrário, refere-se aos chamados direitos potestativos ou direitos cujo exercício é incontroverso, não cabendo qualquer discussão (à outra parte cabe apenas sujeitar-se ao seu exercício). À evidência, a constituição de ofício do crédito tributário, pela Fazenda Pública, não é um direito potestativo.
Assim, a decadência no direito tributário, muito singelamente, refere-se á extinção do direito da Fazenda Pública de constituir o crédito tributário, mediante procedimento administrativo de lançamento. Já a prescrição, cujo prazo começa a correr a partir da constituição definitiva do crédito tributário (CTN, art. 174), refere-se ao direito de ajuizar a competente ação de execução fiscal (pretensão impositiva da Fazenda Pública).
O art. 142 do CTN conceitua lançamento como o procedimento administrativo, privativo da autoridade, de constituir o crédito tributário, compreendendo, entre outros elementos, a verificação da ocorrência do fato gerador da correspondente obrigação.
Ora, a incidência do tributo depende da conjugação da norma com o fato, ou seja, da sua previsão em lei com a ocorrência de fato-do-mundo que corresponda ao fato descrito na lei como hipótese de incidência tributária.
A norma que podemos extrair dos textos normativos (ou a partir deles construir) diz-se geral (dirigida a todos) e abstrata (descreve fato ainda não acontecido). O lançamento, por sua vez, corresponde à construção, pela autoridade administrativa competente, de norma individual (dirigida a contribuinte determinado) e concreta (refere-se a fato já acontecido).
Continuando a rever conceitos, temos que a notificação é a comunicação ao sujeito passivo do lançamento, intimando-o a recolher o tributo. O lançamento aperfeiçoa-se com a notificação, de modo que o lançamento que não foi regulamente notificado ao sujeito passivo não produz efeitos (não pode ser cobrado).
Pois bem, o art. 4º da Lei 7.543/88, que instituiu o IPVA em Santa Catarina, determina que “o imposto será devido anualmente e recolhido nos prazos fixados em regulamento”. O cálculo, pelo sujeito passivo, do imposto devido, mediante consulta à tabela aprovada por portaria do Secretário da Fazenda (RIPVA, art. 3º, § 2º), e seu subseqüente recolhimento na rede bancária, integralmente ou parcelado, nos prazos determinados pelo art. 10 do RIPVA, nada mais é que simples cumprimento de dever legal. Isto por que as disposições de lei, do regulamento e das portarias do Secretário da Fazenda (tabelas) referem-se à norma geral e abstrata – dirigem-se a todos e referem-se a evento hipotético (fato ainda não acontecido).
Ora, a Segunda Turma do STJ decidiu no AgRg no Agravo no Resp 185.322 SP, relator o Min. Humberto Martins, que “a constituição do crédito decorrente de imposto sujeito a lançamento de ofício ocorre no momento da notificação para pagamento, e não da data da lavratura do auto de infração que aplica a multa por falta de pagamento”.
Com efeito, enquanto não houver manifestação da Fazenda Pública cobrando o IPVA, corre apenas prazo de decadência. É preciso que a Fazenda lance o imposto – edite norma individual e concreta – para que seja constituído o crédito tributário e passe a correr o prazo de prescrição.
No caso da legislação catarinense não há qualquer ato por parte da Fazenda Pública cobrando o IPVA, cabendo ao sujeito passivo calcular o imposto devido, pela consulta das tabelas respectivas, e efetuar o recolhimento junto à rede bancária, integralmente ou parceladamente, nos prazos regulamentares, à sua escolha. Somente após o decurso do prazo regulamentar, sem que o sujeito passivo tenha efetuado o recolhimento, é que a Fazenda promove a constituição de ofício do crédito tributário e a imposição da multa pertinente.
Neste ponto, devemos indagar se o IPVA em Santa Catarina é efetivamente tributo sujeito a lançamento direto ou, pelo contrário, se sujeita a lançamento por homologação? Ora, se a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de calcular e recolher o tributo, “sem prévio exame da autoridade administrativa”, estamos, nos termos do art. 150 do CTN, diante de lançamento por homologação. Assim sendo, o prazo de decadência corre a partir da ocorrência do fato gerador que, no caso do IPVA, o art. 2º, III, da Lei 7.543/88, fixa em 1º de janeiro de cada ano.

Portanto, enquanto não houver manifestação inequívoca da Fazenda Pública, cobrando o IPVA, corre prazo de decadência e não de prescrição, de acordo com a jurisprudência colacionada do Superior Tribunal de Justiça.

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