Velocino Pacheco
Filho
O art. 150 do
Código Tributário Nacional caracteriza o lançamento por homologação como aquele
em que o contribuinte tenha o dever de “antecipar o pagamento sem prévio exame
da autoridade administrativa”. O pagamento antecipado pelo sujeito passivo
extingue o crédito tributário, “sob condição resolutória da ulterior
homologação do lançamento” (CTN, art. 150, § 1º e art. 156, VII).
Acrescenta o § 4º
do mesmo artigo que o prazo para a homologação é de cinco anos, contados da
ocorrência do fato gerador. Expirado esse prazo, sem que a Fazenda Pública se
tenha pronunciado, “considera-se homologado o lançamento e definitivamente
extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou
simulação” (homologação tácita).
A antecipação do
pagamento pressupõe uma atividade do contribuinte de cálculo do tributo e
apuração do que deve recolher ao Erário. Também constitui dever legal do
contribuinte informar à Fazenda o valor devido. A partir desse momento, em
relação ao valor declarado pelo contribuinte (e não recolhido), não há que se
falar mais em prazo de decadência, pois, passa a correr prazo de prescrição
para a cobrança judicial do crédito tributário. Então, não cabe constituição de
ofício desse crédito (notificação fiscal), uma vez que já foi constituído pela
declaração do sujeito passivo (autolançamento).
Com efeito,
conforme Súmula 436 do STJ, “a entrega de declaração pelo contribuinte
reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer
outra providência por parte do fisco”.
A Primeira Turma
do Tribunal esclarece, no julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial
819.627 SP (DJe de 8-6-2006, p. 146), que “cuidando-se de crédito tributário
originado de informações prestadas pelo próprio contribuinte através de Guia de
Informação e Apuração do ICMS (GIA), a constituição definitiva do crédito
tributário dá-se no exato momento em que há a apresentação desse documento”.
A legislação
catarinense, Lei 5.983, de 1981, art. 62, § 1º, permite a inscrição em dívida
ativa do imposto apurado e declarado pelo sujeito passivo, não recolhido no
prazo regulamentar, independentemente de notificação ao devedor. Incide, na
hipótese, a multa prevista no art. 51, I, da Lei 10.297, de 1996.
O lançamento de
ofício do crédito tributário, com o prazo previsto para reclamação do sujeito
passivo junto ao TAT e subsequente discussão administrativa pode ser
surpreendido pela prescrição do direito da Fazenda de ajuizar a competente ação
de execução.
Pois bem, se o
imposto declarado pelo sujeito passivo não está sujeito a prazo de decadência,
a fluência desse prazo ocorre em relação a que? Naturalmente ao que não foi
declarado: o tributo não submetido voluntariamente à tributação ou o crédito
indevidamente aproveitado ou o benefício fiscal a que não tinha direito. Está
sujeito a prazo de decadência o imposto correspondente a fato gerador e que não
foi declarado e, por conseguinte, não foi antecipado.
Em princípio, o
prazo de decadência rege-se pelo art. I73, I, do CTN: “o direito da Fazenda
Pública constituir o crédito tributário extingue-se após 5 (cinco) anos,
contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento
poderia ter sido efetuado”. Porém, no caso do lançamento por homologação,
existe regra especial de decadência que é a do § 4º do art. 150: cinco anos
contados da ocorrência do fato gerador da obrigação tributária. No entanto, a
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que esse prazo especial
de decadência somente se aplica se houver antecipação do pagamento do imposto
apurado pelo sujeito passivo. A falta de pagamento descaracterizaria o
lançamento como por homologação, recaindo na regra do art. 173, I.
Temos, então, que,
no caso de lançamento por homologação, conta-se o prazo de decadência pela
regra do § 4º do art. 150, exceto nas seguintes situações, em que se aplica a
regra do art. 173, I: (i) não houve antecipação do imposto declarado; e (ii)
comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Naturalmente, essa “comprovação”
compete ao Fisco, pois não se presume a ocorrência de dolo, fraude ou
simulação.
Portanto, havendo
antecipação do imposto declarado, ainda que parcial, o prazo de decadência do
direito do Fisco de constituir o crédito tributário – bem entendido, o crédito
não declarado pelo contribuinte e apurado pelo Fisco, no decurso de
procedimento de fiscalização – é de cinco anos contados da ocorrência do fato
gerador, nos termos do § 4º do art. 150 do CTN.
Ora, nos termos da
Lei catarinense 10.297, de 1996, o fato gerador do ICMS “operação relativa à
circulação de mercadorias” considera-se ocorrido no momento da saída da
mercadoria do estabelecimento do contribuinte (arts. 2º, I, e 4º, I). O imposto
devido em cada operação é o resultado da aplicação da alíquota sobre a
respectiva base de cálculo que, no caso, é o valor da operação de saída (art.
10, I). Contudo, o que o sujeito passivo antecipa, no lançamento por
homologação, é o imposto apurado – i. e.
o resultado da diferença entre o imposto debitado e o crédito correspondente
(imposto que onerou a mercadoria em fases anteriores de comercialização).
O imposto apurado,
no entanto, ressalvadas as hipóteses previstas em lei, não é calculado em cada
operação de saída, mas, conforme art. 32 da mesma lei, “mensalmente, pelo confronto entre os débitos e os créditos escriturados
durante o mês, em cada estabelecimento do sujeito passivo”.
Assim,
para aplicação da regra de decadência prevista no § 4º do art. 150 do CTN, é
irrelevante se a antecipação foi do (i) total do imposto declarado ou (ii) a fortiori, do total do imposto devido.
Nesse
sentido, a Segunda Turma do STJ tem decidido que “nas exações cujo lançamento se
faz por homologação, havendo pagamento antecipado, conta-se o prazo decadencial
a partir da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN), que é de cinco
anos”. E arremata: “somente quando não há pagamento antecipado, ou há prova de
fraude, dolo ou simulação é que se aplica o disposto no art. 173, I, do CTN” (REsp
260.040 SP; DJ 14.12.2006 p. 330).
Mais recentemente,
a mesma turma decidiu (AgRg no REsp 1.277.854 PR, rel. Min. Humberto Martins,
DJe 8-6-2012):
“1. A Primeira Seção, conforme
entendimento exarado por ocasião do julgamento do Recurso Especial repetitivo
973.733/SC, Rel. Min; Luiz Fux, considera, para a contagem do prazo decadencial
de tributo sujeito a lançamento por homologação, a existência, ou não, de
pagamento antecipado, pois é esse o ato que está sujeito à homologação pela
Fazenda Pública, nos termos do art. 150 e parágrafos do CTN.
2. Havendo pagamento, ainda que não
seja integral, estará ele sujeito à homologação, daí porque deve ser aplicado
para o lançamento suplementar o prazo previsto no § 4º desse artigo (de cinco
anos a contar do fato gerador). Todavia, não havendo pagamento algum, não há o
que homologar, motivo porque deverá ser adotado o prazo previsto no art. 173,
I, do CTN.”
Em síntese: 1. Em
relação ao imposto apurado e declarado pelo sujeito passivo, não corre prazo de
decadência, mas de prescrição, contado da declaração; 2. A declaração do
sujeito passivo constitui o crédito tributário (autolançamento); 3. O imposto
declarado e não recolhido deve ser inscrito em dívida ativa, sendo
desnecessário qualquer outro ato administrativo constitutivo do crédito; 4. O
imposto que não foi declarado, constatado mediante procedimento de
fiscalização, deve ser constituído de ofício (lançamento suplementar); 5. O
prazo para proceder ao lançamento suplementar será (a) o do § 4º do art. 150 do
CTN, caso tenha havido algum recolhimento, ainda que parcial, do imposto
declarado ou (b) o do art. 173, I, no caso de não ter havido qualquer
recolhimento ou se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.
No Estado de Santa Catarina, a multa por inadimplência decorre da lei e é exigida pela atividade vinculada do agente fiscal. Mas o imposto em si, que é apenas consolidado e atualizado na notificação, como dito, já foi lançado pelo contribuinte. Também concordo que a lei deveria ser modificada, aplicando-se apenas 20% de multa de ofício, na inscrição em Dívida Ativa. Seria uma providência em prol da eficiência e racionalização do serviço público. No Paraná, isto já ocorre há mais de 40 anos, desde que foi criada a GIA (1971).
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