DIREITO TRIBUTÁRIO EM DEBATE

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quarta-feira, 28 de agosto de 2013

O art. 3º, II, da Constituição e a tributação das exportações

            Velocino Pacheco Filho
          O art. 3º, II, da Constituição Federal dispõe que constitui um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, garantir o desenvolvimento nacional.

          Por outro lado, o art. 155, § 2º, X, “a”, redação dada pela Emenda Constitucional 42/2003, determina que o ICMS não incidirá “sobre operações que destinem mercadorias para o exterior, nem sobre serviços prestados a destinatários no exterior, assegurada a manutenção e o aproveitamento do montante do imposto cobrado nas operações e prestações anteriores”.
         
          A redação original do dispositivo era que o imposto não incidiria “sobre operações que destinem ao exterior produtos industrializados, excluídos os semi-elaborados definidos em lei complementar”. A definição de semi-elaborado, para fins de incidência do ICMS, foi dada pela Lei Complementar 65/1991.

          A Constituição de 88 permitia aos Estados tributar os produtos primários e os semi-elaborados (baixo nível de industrialização). Percebe-se a intenção do constituinte de favorecer a agregação de valor no País e a geração de emprego. Já a EC 42/2003 garante a agregação de valor e a geração de emprego no país importador.

          Devemos agora indagar: em que medida a nova redação do dispositivo, conforme a EC 42/2003, contribui para o cumprimento do objetivo fundamental de “garantir o desenvolvimento nacional”?

          Costuma-se distinguir entre “crescimento” e “desenvolvimento”. Assim, podemos dizer que há crescimento quando a capacidade produtiva da economia aumenta. Pode ser medido pela taxa anual de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Mas, para termos “desenvolvimento”, seria necessário somar ao crescimento, a melhoria da qualidade de vida. O desenvolvimento então não é somente o crescimento econômico, mas o crescimento harmônico econômico, social, cultural e político.

          O desenvolvimento é medido, não apenas pelo crescimento do PIB, mas pelo índice de Desenvolvimento Humano (IDH), composto por três parâmetros: (i) expectativa de vida, (ii) nível médio de educação e (iii) PIB per capita. Esse índice vem sendo utilizado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) na avaliação dos diversos países.

          Só para refletir: segundo dados de 2012, divulgados em 2013, o IDH do Brasil é de 0,73, enquanto o do Chile é de 0,819, o da Argentina é de 0,811, o do Uruguai é de 0,792 e o do Peru é de 0,741. Ou seja, independentemente do desempeno da economia, na “Copa do Desenvolvimento”, nós estamos na Série B.

          Fala-se ainda em “desenvolvimento sustentável”, o que significa a satisfação das necessidades da geração atual, mas sem comprometer a satisfação das necessidades das gerações futuras. Isso implica a utilização preservacionista (ou não predatória) dos recursos do planeta.

          A desoneração tributária dos produtos primários representa um desestímulo à agregação de valor no País e, via de conseqüência, a não geração de emprego e renda. Sem aumento de renda, não há desenvolvimento do mercado interno. No que se refere ao comércio internacional, a ênfase na exportação de produtos primários leva a uma relação de troca desfavorável, considerando a elasticidade-renda dos produtos primários em comparação com os manufaturados.

          Como compatibilizar uma política de desoneração tributária da exportação de produtos primários com os objetivos fundamentais da República, previstos no art. 3º da Carta, entre os quais estão a garantia do desenvolvimento nacional (inciso III) e a erradicação da pobreza e da marginalização e a redução das desigualdades sociais e regionais.

          Conforme adverte Diniz Alves, do ENCE/IBGE, temos um prazo até 2025, em que a estrutura etária brasileira ainda se manterá favorável. Avalia esse autor que se mantivermos, nesse prazo, um crescimento econômico entre 4 e 5% ao ano, seria possível atingirmos o pleno emprego, a redução da pobreza e o avanço na qualidade de vida, ou seja, a realização dos objetivos fundamentais da República. Esse prazo deve ser aproveitado para promover as reformas e os investimentos necessários em infra-estrutura, saúde e educação.  Nessa perspectiva, o crescimento do PIB de 2,7% em 2011 e de 0,9% em 2012 não são animadores.

          Tudo ocorre como se faltasse ao Estado brasileiro a necessária sensibilidade para priorizar a concretização dos objetivos fundamentais da República referidos no art. 3º da Constituição.

Um comentário:

  1. Caríssimo,
    Ótimo artigo. Algumas observações: a) o IDH melhora o PIB no que se refere ao “desenvolvimento”, mas ainda tem falhas: veja que na frente do Brasil se encontram Brunei, Emirados Árabes, Kwuait, Seychelles, Arábia Saudita, Líbia etc! Parece que “desenvolvimento” tem mais a ver com diversificação da produção, o que falta nesses países. b) discordo do pessimismo quanto à agricultura (e a produção primária, em geral) e a consequente ênfase na indústria e sobre isso, sugiro fortemente a leitura do artigo de Eugênio Gudin que se encontra na Internet em http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/viewFile/1725/6014. Grande abraço, Lauro

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