Velocino Pacheco
Filho
O inciso XXII do art. 37 da Constituição da
República dispõe que “as administrações tributárias da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios, atividades essenciais ao funcionamento do
Estado, exercidas por servidores de carreiras específicas, terão recursos prioritários
para a realização de suas atividades e atuarão de forma integrada,
inclusive com o compartilhamento de cadastros e de informações fiscais, na
forma de lei ou convênio”.
Por
sua vez, o inciso IV do art. 167 da Lei Maior excetua da vedação à vinculação
de receitas de impostos precisamente a destinação de recursos para a realização
de atividades da administração tributária, como determinado pelo art. 37, XXII.
Agora,
discute-se a própria autonomia administrativa e orçamentária do Fisco.
A
quem serve essa autonomia?
Se
for para instituir privilégios e vantagens pessoais para os membros da classe
dos auditores fiscais, estaremos trilhando o caminho da iniquidade. Estaremos
criando uma nova “nomenclatura”.
A
autonomia somente se justifica em benefício da cidadania, para que os
funcionários fiscais possam exercer suas atividades de acordo com o ordenamento
jurídico-tributário, independentemente das preferências e da vontade do
governante (quando estas colidirem com a lei e com o interesse público).
Conforme
determina o art. 3º do Código Tributário Nacional, o tributo é cobrado mediante
atividade administrativa plenamente vinculada. Como a atividade administrativa
é vinculada, o Fisco somente pode agir em estrita conformidade com a lei, sem
qualquer margem para discricionariedade. O Fisco não pode exigir do
contribuinte nada a menos que o devido, nem além do devido.
Ainda
como parte da Administração Pública, o Fisco está sujeito aos princípios
relacionados no art. 37 da Constituição: legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência. O Fisco somente pode agir estritamente de acordo com
a lei; tratar a todos os contribuintes da mesma forma, sem favoritismos ou
preferências; segundo os ditames da moral, sem engodos, trapaça ou má-fé; dando
publicidade aos seus atos, respeitado o que estiver protegido por sigilo (como,
por exemplo, informações sobre os negócios do contribuinte); e com eficiência,
dando o melhor uso aos recursos disponíveis, mas sem prejuízo dos demais
princípios mencionados.
Assim,
as exonerações tributárias (as exceções ao princípio de que todos devem
contribuir para o custeio do setor público) somente podem ser aceitas se
puderem ser justificadas com base no princípio da isonomia (tratar igualmente
os iguais e desigualmente os desiguais) ou com propósitos extrafiscais (quando a
dispensa do tributo colabora mais para a consecução dos objetivos fundamentais –
art. 3º da CF – do que a sua cobrança).
A
autonomia do Fisco somente se justifica para fazer a justiça fiscal: combater
as políticas de exoneração tributária que somente beneficiam os “amigos do rei”;
resistir às leis inconstitucionais; pugnar pelo bom cumprimento da lei, no
interesse da população; preservar o interesse público; realizar o bem comum e
defender a indisponibilidade da coisa pública.
A
constituição do crédito tributário, conforme parágrafo único do art. 142 do CTN
é atividade administrativa vinculada e obrigatória o que deve ser entendido no
duplo sentido de não poder ser cobrado tributo não previsto em lei e nada a
menos do que o previsto em lei, sem prejuízo do direito do contribuinte ao
contraditório, à ampla defesa e ao
devido processo legal tributário.
A
autonomia do Fisco deve significar proteção ao contribuinte contra leis
inconstitucionais e a tratamento tributário discriminatório. Pois, como alerta Poulantzas: “Frequentemente
o Estado age transgredindo a lei-regra que edita, desviando-se da lei ou agindo
contra a própria lei”. O autor acrescenta que isso não resulta da mera
ignorância, mas que o governante tem plena consciência do que está fazendo.
Enfim,
a autonomia do Fisco justifica-se porque os governos são transitórios, mas o
Fisco é permanente.
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