DIREITO TRIBUTÁRIO EM DEBATE

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quinta-feira, 25 de julho de 2013

brindes

Qual deveria ser o tratamento tributário dos brindes?
          Velocino Pacheco Filho

Para início de conversa, o que é brinde? Há consenso em que se caracteriza como brinde a mercadoria adquirida pela empresa com a finalidade de distribuição gratuita aos seus clientes, fornecedores etc. A saída de brindes do estabelecimento é geralmente considerada tributada pelo ICMS, adotando-se como valor da operação (base de cálculo do imposto) o valor de aquisição, já que a sua distribuição é gratuita.
Um caso que tem relação com o dos brindes é o da bonificação em mercadorias, ou seja, unidades da mercadoria acrescentadas gratuitamente à compra pelo vendedor. A diferença é que, no caso dos brindes, as mercadorias doadas não são normalmente comercializadas pela empresa, enquanto, na bonificação, as unidades doadas ao cliente são de mercadoria que a empresa normalmente comercializa.
De modo semelhante ao que ocorre com os brindes, os Estados costumavam tributar as mercadorias dadas em bonificação, imputando-lhes um valor (o da aquisição) como base de cálculo do imposto. Esse entendimento verificou-se equivocado, como demonstra Hugo de Brito Machado (Aspectos Fundamentais do ICMS):
“Quando o vendedor de cem unidades de medicamento dá em bonificação dez unidades, na verdade ele está vendendo cento e dez unidades pelo preço das cem. Não importa que as cem unidades tenham sido vendidas, e as dez tenham sido doadas. Há, nestes casos, evidente relação de dependência entre a doação e a venda, de sorte que sem esta aquela não existiria”.
Ou seja, as mercadorias dadas em bonificação correspondem a um “desconto incondicionado” e, como tal, devem ser excluídas da base de cálculo do ICMS. Esse entendimento foi adotado pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, conforme decidido no julgamento do Recurso Especial 1.111.156 SP:
“A bonificação é uma modalidade de desconto que consiste na entrega de uma maior quantidade de produto vendido em vez de conceder uma redução do valor da venda. Dessa forma, o provador das mercadorias é beneficiado com a redução do preço médio de cada produto, mas sem que isso implique redução do preço do negócio”.
Para que não restassem dúvidas, acrescentou o tribunal que a literalidade do art. 13 da Lei Complementar 87/96 permite concluir que a base de cálculo do ICMS, nas operações mercantis, é a efetivamente realizada, não se incluindo os descontos incondicionais, como é o caso das bonificações em mercadorias.
Retornando ao caso dos brindes, é lícito ao Estado imputar um valor à saída de brindes e sobre ele cobrar ICMS? Conforme arts. 12, I, e 13, I, da LC 87/96, a base de cálculo do imposto, na saída de mercadoria do estabelecimento do contribuinte é o valor da operação. Ora, os brindes são distribuídos gratuitamente, logo a operação de saída do estabelecimento não teria valor, salvo se o valor for imputado pelo Fisco. Ele está autorizado a fazê-lo?
Outro aspecto do problema envolve a caracterização do fato gerador do ICMS: deve tratar-se de operação de circulação de mercadorias. Decompondo o fato gerador, devemos identificar o que é mercadoria e o que é circulação de mercadorias. Conforme regra do art. 110 do Código Tributário Nacional, o conceito de mercadoria deve ser pesquisado no direito privado.
Considera-se mercadoria o bem móvel adquirido para fins de revenda. Assim, toda mercadoria é um bem, mas o bem pode ou não ser mercadoria, dependendo da intenção com que foi adquirido. Se houve intenção de revenda, o bem se caracteriza como mercadoria; se foi adquirido para uso ou consumo, não será mercadoria. Um mesmo bem pode ser mercadoria em um momento e não sê-lo em outro.
Ora, o brinde não foi adquirido para ser revendido, mas para distribuição gratuita. Com isso podemos entender que perdeu a condição de mercadoria? Embora a distribuição de brindes atenda a um propósito comercial (marketing), é razoável o entendimento de que não se trata mais de mercadoria? A propósito, não só as empresas comerciais distribuem brindes, mas também os estabelecimentos financeiros, os prestadores de serviços, etc.
Por outro lado, entende-se que a operação é de circulação de mercadoria quando a impulsiona no sentido do produtor para o consumidor final. Além disso, não se caracteriza com o seu mero deslocamento, mas é necessária a mudança de titularidade do bem. Nesse caso, a distribuição de brindes representa uma mudança de titularidade e a operação destina o bem ao consumidor final.

Assim, a questão resume-se em saber se o brinde caracteriza-se como mercadoria ou não. Se for mercadoria, a operação sofre a incidência do ICMS, calculado sobre base de cálculo imputada pelo Fisco e poderá ser utilizado o crédito relativo à sua entrada no estabelecimento. Porém, se não for mercadoria, além de não ser devido o ICMS, na saída do estabelecimento, também não poderá ser apropriado o crédito correspondente à sua entrada, já que o adquirente seria o consumidor final dos brindes.

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