DIREITO TRIBUTÁRIO EM DEBATE

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quinta-feira, 25 de julho de 2013

Confaz

Os convênios Confaz e o princípio da reserva legal
          Velocino Pacheco Filho

Diz o § 6º do art. 150 da Constituição Federal que qualquer subsídio ou isenção, reddução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica [...], sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2º, XII, g. O dispositivo citado diz que cabe à lei complementar regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. Trata-se do regime dos convênios celebrados no âmbito do Confaz, nos termos da Lei Complementar 24/75.
Contudo, qual o alcance da parte final do § 6º do art. 150 da CF? Os convênios suprem a necessidade de lei, para essa finalidade específica, ou o convênio é apenas uma condição para que a lei conceda o benefício fiscal. Na segunda hipótese, cada Estado somente poderia conceder benefício fiscal mediante lei, após prévia autorização do Confaz.
No entanto, a prática dos Estados não tem sido esta. Os Estados e o Distrito Federal celebram  convênio, dispondo sobre isenções, incentivos e demais benefícios fiscais, que são ratificados por decreto e introduzidos na legislação estadual mediante decreto (regulamento). A legislação de alguns Estados, como é o caso de Santa Catarina, exigem que os convênios sejam homologados pela Assembléia Legislativa.
Resultam, então, duas disciplinas distintas para a concessão de isenções, incentivos e benefícios fiscais: (i) convênio, no caso do ICMS, celebrado conforme a LC 24/75; (ii) lei, no caso dos demais tributos.
Essa prática tem prevalecido, a despeito da jurisprudência em contrário do Supremo Tribunal Federal. Com efeito, entende a Corte Suprema que todos os convênios Confaz são meramente autorizativos: “a Lei Complementar 24/75 não admite a distinção entre convênios autorizativos e convênios impositivos” (RE 98.952-8 SP, LEX 54:247, j. 26-11-82).
Além de prévio convênio autorizando a concessão do benefício fiscal, seria necessária a edição de lei, em sentido formal, concedendo o benefício. É o que diz o  Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 637.959 DF (Primeira Turma, relatado pelo Min. Luiz Fux, julgamento em 19-2-2013):
“A elaboração do convênio entre os entes federados deve preceder à edição da lei que conceda os benefícios fiscais, pouco importando em qual momento haverá a produção de efeitos plenos da norma. Isso porque a deliberação prévia dos Estados-membros e do Distrito Federal é requisito constitucional de validade do benefício, cuja observância acaba por inquiná-lo desde o nascedouro”.
Também o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário 630.705 MT, relatado pelo Min. Dias Toffoli (Primeira Turma, 11-12-2012) reconheceu a impossibilidade de o benefício fiscal ser implementado à margem da participação do Poder Legislativo. Esclarece o acórdão:
“Os convênios são autorizações para que o Estado possa implementar um benefício fiscal. Efetivar o beneplácito no ordenamento interno é mera faculdade, e não obrigação. A participação do Poder Legislativo legitima e confirma a intenção do Estado, além de manter hígido o postulado da separação de poderes concebido pelo constituinte originário”.
Convivemos, então, com as seguintes possibilidades: (i) benefícios autorizados por convênio e introduzidos na legislação tributária estadual mediante decreto; (ii) benefícios concedidos por lei, sem terem sido autorizados por convênio; e (iii) benefícios introduzidos na legislação por decreto, sem lei e sem convênio autorizativo.
Todas as três possibilidades padecem do vício de inconstitucionalidade. Na hipótese (i), por falta de lei em sentido formal: as exonerações tributárias estão sob reserva absoluta da lei que não pode ser suprida pelo convênio ou pelo decreto. Na hipótese (ii), falta a imprescindível autorização prévia por convênio, como exigido expressamente pela Constituição. E, finalmente, na hipótese (iii) estamos diante de decreto autônomo – não permitido pelo ordenamento tributário brasileiro – que inova o ordenamento, extrapolando os limites da regulamentação das leis, conforme dispõe o art. 84, IV, in fine, da Constituição da República. Essas três possibilidades abarcam a totalidade dos benefícios fiscais em vigor no Estado, relativos ao ICMS.

As isenções, incentivos e benefícios fiscais, relativos ao ICMS, dependem, pois, cumulativamente (i) da celebração de convênio autorizativo, na forma da LC 24/75 e (ii) da edição de lei pelo Estado-membro concedendo o benefício. 

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